Seu Zé Jacaré
Essa é a história do Seu Zé Jacaré que morava numa lagoa bem escura. Seu Zé Jacaré era um jacaré de papo amarelo muito mal-humorado que vivia numa lagoa lá no Rio de Janeiro. A lagoa era bem escura e mal se enxergava seu Zé quando ele escondia a cabeça no fundo, escondido entre as árvores e as pedras da margem. Perto da lagoa moravam, também, duas capivaras e seis miquinhos que adoravam se exibir nos galhos secos das árvores. Mas, Seu Zé Jacaré estava sempre sozinho, nenhuma fêmea queria namorar esse velho jacaré. Ele tinha um olho bom e outro caolho porque, uma tarde, jogaram uma pedrinha para brincar, que acertou o olho direito dele. Desde então, seu Zé ficou muito chateado, porque além de gordo, tinha um olho caolho. Pessoas jogavam comida todos os dias para os jacarés da lagoa, mas seu Zé não chegava nem perto, preferia os peixinhos e alguns passarinhos bobos que ousavam se aventurar perto dele. Ele tinha muito medo de ficar sem outro olho. Havia mais de sete famílias de jacarés de papo amarelo naquela lagoa e todos viviam felizes. As mamães dos jacarezinhos faziam seus ninhos nos montes de lixo que desciam o rio todos os dias. Nunca, nunquinha faltava comida e diversão naquela lagoa. Os outros jacarés da vizinhança e das outras lagoas, atravessavam avenidas enormes para conhecer a lagoa do Seu Zé Jacaré. Em dias de muita chuva, ficavam faceiros com o aguaceiro, vindo nadando e comemorando a inundação da cidade. Se arriscavam mesmo, mas seu Zé só queria boiar e deslizar sossegado nas águas turvas da lagoa. Ficava horas e horas ali feito estátua sentindo um raio de sol bem na ponta do seu nariz. Isso sim era vida! As crianças da vizinhança adoravam quando Seu Zé Jacaré aparecia perto da ponte. “Olha lá, o jacaré grandão!!! Aquele caolho”. Rapidinho, Seu Zé Jacaré dava uma rabanada e plutz pra o fundo da lagoa. Uma noite de inverno, em julho ou agosto, teve uma ventania e uma chuvarada danada. A lagoa encheu até transbordar e as mamães jacarés se apressaram a ajudar seus filhotes a ficarem seguros num buraco na margem. Muitos raios e relâmpagos assustavam todos os bichinhos e o barulho era tanto, que mal se ouvia a gritaria dos micos que fugiam horrorizados. Seu Zé Jacaré não se importava e aproveitava esses momentos para tomar um banho de mar ali na praia. Ia deslizando pela lagoa com aquele rabão pra lá e pra cá, curtindo o vendaval e a solidão. Mal podia esperar para sentir as ondas do mar batendo no papo amarelo, variar o cardápio e se deliciar com os moluscos que as ondas traziam. Quando amanheceu, estava tudo calmo, a lagoa estava espelhada novamente e todos começaram a se procurar, chamando cada bicho por seu nome. O único que não disse “presente” foi Seu Zé Jacaré. Todos estranharam, porque ele não ficaria na praia ao amanhecer. Fizeram uma patrulha de buscas, os jacarés, as capivaras e os micos, todos preocupados com o destino do velho jacaré. Foram dar na praia, com um monte de gente envolta de um jacaré enorme. O jacaré havia levado três tiros, para não machucar os banhistas e pescadores que já estavam na praia desde cedo. A patrulha voltou e contou a todos o triste fim do Seu Zé, um jacaré lendário, que só queria viver boiando na lagoa. Fim!
2 Comments
O perigo da liberdade de ir e vir, mesmo acobertado pela tempestade, é que ela depende de quem está do outro lado do revólver.
Verdade! Liberdade é cara e perigosa.